quinta-feira, 29 de agosto de 2019

escapu-lá


um osso alado que faz a gente dançar:
a minha avó adorava dizer
era coisa que sua mãe lhe contava
que havia no tempo de sua avó
como era isso, vó
eu perguntava
de dar na gente um desejo de dança?
uma escápula maior que a outra,
minha filha
uma escápula maior que a outra
e eu
com meu pé minha cabeça
comecei a pensar
na falta que o osso alado faz
na construção de um delírio coletivo

a morte é uma flor para Celan


a morte é uma flor que sobe os degraus do ar
que puxa fio do novelo já cortado
que engole caroço sem saber
a morte é uma flor que dilacera
chora em cima e cospe
mais uma vez
a morte é
esta flor que cala
mais uma vez
esta flor que vibra
a morte é uma flor que fala
com quem vive de silêncio.
melancólica,
a morte é uma flor que brilha,
a estrelinha...
melancólico,
a morte é uma flor
é um livro do caralho

fogo-poema

tenho deixado caixas de fósforo
viradas pro lado errado
os palitos
caem na mala aberta
que está sempre no chão
ao lado da cama,
o professor cubano me disse
que em maio eu conheceria alguém
e em maio em você eu dei um beijo
você falava algo com as vontades do cinema
ou talvez bobeiras
que trocam pessoas de uma certa idade
de um mesmo lugar
a cidade do coração
onde nada é mais tão próximo um do outro
quanto o
ímã
que compraram pra você
quando te lembraram de um outro país,
às vezes acho que não são eles surtando
mas você
muitas das poetas que gosto descubro 
mortas
elas por elas 
mas vencer é tombar
foi o que li essa manhã
enquanto tomava café
e distraída
fiz fogo.